
Antiga Adega de A. Valente, na Rua do Souto
O Motim
Dos amotinados de 1757
nomeio a Estrelada.
Se gostava da pingoleta
é coisa que não sei:
o vinho tem razões
que a razão desconhece
e as razões são aos milhões.
Certo, certo é que o Marquês
disse por cima do ombro:
nas tabernas do Porto
vinho só o da Companhia - ponto
final. Vírgula, disse o povo,
fazendo contas de cabeça.
E nessa quarta-feira
As ruas acenderam-se.
E o sol... moita carrasco.
Abaixo a Companhia!
E foi o pandemónio.
Veio a tropa, veio a lei,
homens de má catadura.
Forca, açoites, calabouço,
confiscação e galés.
Foi quase meio milhar
de tripeiros que julgavam
que o povo é quem mais ordena.
O sol já tinha remorsos:
quem é aquela criança
que assiste à morte do pai?
Condenada, meu senhor.
Da forca pendem treze homens,
quatro mulheres também.
A Estrelada estava grávida
- salvaram-se as aparências.
Ah vocês cuidam que sim?
Cuidam que o rei é um boneco
e que, ao fim de quatro meses,
lá por nascer um fedelho,
a lei vai servir de fralda?
Sobe à forca, ó Estrelada,
e que o Marquês se console,
enquanto o rei come o sol
num cubo de marmelada.
António Cabral
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O motim popular do Porto, em 1757, foi provocado pela decisão régia de não permitir que as tabernas do Porto vendessem vinho que não fosse o da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro (criada no ano anterior) (N.A.)
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in Ao Porto, Colectânea de Poesia sobre o Porto, Publicações D. Quixote, 2001