07 abril 2007

Do moinho e da vida



«Não me fotografe, fico muito velha nas fotografias», diz-me Maria Estrela. «Eu ponho-a nova», respondi-lhe. E ela aí está, fazendo jus ao nome, sorridente, digna, com uma vida de trabalho marcada no rosto.





Nasceu ali, em Coucela, Penha Longa, freguesia ribeirinha do grande rio. Tem cinco filhos e onze netos, todos residentes em Portugal - coisa rara nesta terra marcada pela emigração. Aos oitenta anos ainda semeia, colhe, mói e faz o pão. Vive entre pés de vinha e árvores de citrinos. É Domingo e Maria Estrela de Oliveira enverga roupas de trabalho. Para assinalar o dia traz dois vistosos brincos de ouro. Parece divertida com o nosso interesse pelo moinho, mas quantos de nós viram um moinho a trabalhar?



Este é movido pela água do Refojos, um ribeiro que foi cavando um sulco na montanha e corre apressado de pedra em pedra, encosta abaixo, num percurso que não terá mais do que seis quilómetros, até se despenhar no Douro, em Afonsim, duas curvas abaixo do Carrapatelo. Um lugar idílico onde o silêncio apenas é quebrado pela passagem dos barcos que transportam turistas, rio acima, rio abaixo, a horas certas.



Manuel Joaquim Messia, bem tratado, diz manter o moinho por gosto. Tem uma névoa no olhar que lhe tolda a visão. Foi dono de quatro moinhos em Vila Real. Ficaram para trás, perdidos no tempo, quando deixou o Corgo e se instalou nas arribas do Douro, para comprar terra e casar.
O rio de então não era o lago de hoje, comprimido pelas barragens. Corria livremente, tormentoso no Inverno e manso no Verão. Das margens avistavam-se os rabelos transportando vinho, e tudo o mais que o Douro interior produzia, rumo ao Porto.
«Ó senhor Arrais! Quantas pipas levais?». «Levo uma… levo duas… levo três! Vai pró corno que te fez!».
Memórias e vivências de outro tempo, a cada dia que passa mais distante e difícil de encontrar.

56 comentários:

Duarte disse...

Na fim da estrada do Araújo para a Maia, mesmo no cruzamento da que vai para Viana e enfrente da majestosa ponte de granito de belos arcos já marcados pelo tempo, mas que ainda servem de suporte para que passe o metro que une o Porto com a Maia sobre o rio Leça, estão os velhos moinhos donde, o tio Joaquim e a tia Maria, exerciam uma actividade idêntica à das pessoas que muito bem retrata e narra neste excelente trabalho. Actualmente as pedras fazem-se mover pela energia eléctrica, medida que teve de tomar então o meu tio, pois o rio no verão ficava quase seco e até tínhamos que tapar o nariz ao aproximar-nos daquelas latitudes. Aqui fica este comentário para dignificar o trabalho daqueles que então, e outros hoje, tanto contribuem para que não nos falte o pão nosso de cada dia.

Luís disse...

Excelente artigo, gostei bastante!

Ida disse...

Além de exímio fotógrafo, Carlos, ainda te dás ao luxo de passear com com a maior leveza pelas palavras, gerando textos bonitos e bons de sorver como esse. Como adoro a região e tenho uma ligação de sangue com o Douro e suas encostas, esse post tem um atrativo a mais além da beleza das fotos e do texto. Que bom que voltaste!

Beijinho, ainda saboreando pão de ló regado a um porto nascido dessa encosta e desse sol.

João Miranda disse...

Mais um excelente post com belissimas fotos e textos a condizer.

António Conceição disse...

A cidade surpreendente virou "O campo surpreendente".

th disse...

Cantinhos e gente linda que tem a nossa terra, mas também pessoas que teem arte para os ver e fixar.
É um testemunho que nos é grato, para quem, como nós,que ama a sua terra e as suas gentes.
Aquele abraço, th

Anónimo disse...

Este, é sem dúvida, o melhor blog de Portugal!

Anónimo disse...

Já não é a 1ª vez que o Carlos vai ao campo - já nos havia mostrado o Soajo, se não me engano - e tornei a adorar a abordagem. :-) Faz-me lembrar o Prof. J. Hermano Saraiva, que a cada relato nos provoca um desejo imenso de largarmos o que quer que estejamos a fazer para abalarmos rumo ao sítio de que nos esteve a falar. É contagiante.

Espero que o Carlos tenha vindo para ficar. Sou viciada no seu blog. Parabéns.

Anónimo disse...

É uma delícia ler as suas reportagens. Os meus parabéns por mais um belíssimo trabalho. Adoro locais como este, que aqui retratou. Abraço tripeiro.

Anónimo disse...

Fabulosas fotografias! Parabéns!

Pedro Villa disse...

A primeira foto, ficou extraordinária! Os meus parabéns!

Anónimo disse...

Excelente reportagem.
O Douro e o moinho, têm o seu ûê de mistico...

[Ariana Aragão] disse...

O Porto!
O nosso Porto!

jcp (José Carlos Pereira) disse...

Obrigado por me dar a ver aqui as gentes e os ofícios da minha terra, Marco de Canaveses.

Neves de ontem disse...

Que belo olhar tem a senhora da fotografia ,e o coquetismo dos brincos me faz sorrir. Obrigada pela volta, já tinha saudades de um blog tão interessante.

PCS disse...

É uma excelente história ilustrada com grandes imagens. Parabéns pelo belo "trabalho".

a.leitão disse...

Um pouco da Natureza que nos resta e que me fez recordar a minha infância por essas paragens.
Não é saudosismo mas preocupação pela vida que hoje escolhemos.

rps disse...

Surpreendente, de facto.
Apreciei a deriva bucólica.

isabel mendes ferreira disse...

nem sei o que dizer.







olho
volto a olhar


e silencio-me.


fascinada.


como sempre-


rendida.




boa noite. C.

Anónimo disse...

fotografie che ragalano un mondo lontano nello spazio e nel tempo, coke uno sguardo che sa vedere il passato.
Saluti
F

Anónimo disse...

(coke = come)

Diogo Max disse...

Gostei muito do modelo como você elabora os seus posts, todo recheado com fotolegendas e belas fotografias. Além disso, o seu blog está sendo bastante útil, para que eu possa conhecer um pouco da sua cidade. Deverei estar aterrisando nela em setembro desse ano, para um intercâmbio na Universidade do Porto.

Abraços e boa sorte

Anónimo disse...

Um blogue peculiar ,fotografias lindas

Rosa Brava disse...

Meu Caro Carlos Romão:
espero que não se importe que o tenha escolhido entre os cinco nomes para o prémio Award Thinking Blogger.
As regras são as seguintes:
Vai buscar o selo ao meu blogue, coloca no seu e indica depois, outros cinco blogues a quem quer atribuir o Prémio Award...

Basta chegar ao meu blogue e copiar...

Um abraço carinhoso ;)

maresia_mar disse...

Olá

os teus posts e as tuas fotos são sempre fantásticas!

Bjhs e bom fds

Tantra Lounge disse...

Se houvesse um prémio para melhor blog do género teria de ir para este blog. Cada vez que cá venho a Cidade é mais surpreendente. A poesia e a magia do Porto estão presentes em cada texto e em cada fotografia. Lindo.

Pong disse...

Gosto pouco de cidades, mas as suas fotografias, os seus textos, comovem-me até às lagrimas. Obrigada por partilhar connosco um blog com tanta qualidade!

hfm disse...

A luz da fotografia de Mª Estrela é bem digna de quem assim se fez - digna, inteira e ainda "coquette".

Belinha Fernandes disse...

Venho pedir ajuda a um dos meus blogs favoritos!

Os CTT estão a dar a oportunidade de desenharmos um selo para 2008.Papelustro,blogger figueirense, escolheu o tema O imaginário infantil porque...o melhor do mundo são as crianças.Para que a Bruxinha viaje nos envelopes de Portugal inteiro precisa do vosso VOTO!É fácil: cliquem no link, insiram o vosso email e depois confirmem o voto no email que vão receber na vossa caixa de correio!
Obrigada!

Vote aqui

Anónimo disse...

Olá Amigo, boa noite!
Chego somente agora, pois as tarefas têm-me enredado mais que o normal...
E como sempre, fico feliz de aqui vir!!!
É tanta a minha saudade dos tempos em que menina se ia ao moínho levar o grão e depois buscar a farinha, os rios corriam limpos
e das margens( do Leça, no meu caso)se viam os peixitos a brilhar
quando saltavam fora d'água para apanharem alguma mosca...
É claro que a minha visão é romântica; a vida nesse tempo
era bem dura, mas a esta distância, tudo é doce.
Obrigada Amigo pela recordação, na beleza do que nos conta e nos mostra e por não deixar esquecer.
Um abraço de Amizade e Primavera da
Maria Mamede

CC disse...

:)

magarça disse...

Gostei muito desta reportagem. Aliás, de tudo o que vi neste blogue.

noasfalto disse...

Teremos nós um dia estórias e vivências tão fáceis e belas?
Afinal corremos para quê?

ANA LUCIA disse...

AMEI OQUE VC ESCREVEU.ESCREVES MUITO BEM...
ADICIONEI VC NA MINHA LISTA DE AMIGOS....
BEIJOS E PARABENS PELO BLOG.
ANA

Anónimo disse...

Adorei a conjugação das fotografias com o texto. Muito boas mesmo.

Anónimo disse...

A minha Santinha incumbiu-me de distribuir Awards. Foste presenteado por mim. Porque será?

Um abraço

Anónimo disse...

Gosto de cidades, e a maneira como homenageias esta cidade é maravilhosa.
Lindas fotos, lindo blog..
Um abraço.

Belinha Fernandes disse...

Quando tive rum tempo passe no meu blog (art)snack.Atribui-lhe um Thinking Blogger Award mas pelo outra-face...Aprecio imenso este blog.Não sou do Porto, vivi aí 4 meses, se pudesse era a cidade onde viveria para sempre...

Ida disse...

Caríssimo Carlos,
Não era às quartas q se renovava o blog? Tá bem que a vida é curta e os blogs efêmeros e que o concreto sabe melhor que o virtual... mas nunca mais é o dia em que se renova o blog!:(

Beijinhos... Nem o 25 de abril te motivou.. quand même!

LurdesMartins disse...

E então a Rua 31 Janeiro coberta de neve?!?! Não há reportagem?

Beijinhos com saudades

LurdesMartins disse...

Eu fui lá cuscar... e ao passar nos Clérigos, lembrei da OUTRA FACE DA CIDADE: dá dó ver o estado da zona comercial por cima do parque...

Velasquez disse...

fantastico blog:)

abraço.



wwww.albertovelasquez.blogspot.com

Anónimo disse...

:D

Anónimo disse...

Blogue fantastico, retrata uma cidade que muito gostava de conhecer. Foi o teu irmão que me apontou para o teu blog.

Tomei a liberdade de te acrescentar ao meu blogroll (ligações) em liberato.org

APC disse...

Há muito não via eu uma fotografia tão bonita (verdadeiramente deliciosa!) como essa primeira, da risonha D. Maria Estrela!

De resto... Foi lançar olhares sobre uma cidade que me falta quando lá não estou.

Voltarei com mais tempo e alma!

Um abraço.

Menina Marota disse...

Aguardo actualização...já é tempo de vermos novas fotos...:(((

Beijo e boa semana ;)

Bott disse...

Minha primeira vez por aqui. Fiquei impressionado com seu trabalho. Voltarei várias vezes. Agora, com licença, tenho que ler todos os seus arquivos.
Abraços.

Neves de ontem disse...

É lástima não pôr mais fotografias nem esses textos tão giros. Volte, Carlos Romão. Ficamos à espera. Cumprimentos.

LurdesMartins disse...

O mês de Maio está quase, quase a acabar... não terá ele direito a uma postagem?!?

Beijinhos ansiosos

AR disse...

Obrigada por partilhares imagens e pedaços de vida, dos quais às vezes tenho saudades, mesmo sem os ter vivido.

joao disse...

sabe bem ver o nosso portugal assim.
para quem ainda acredita na poesia de uma vida normal. um abraço

Duarte disse...

Não só é um blog sobre a cidade surpreendente como é também o blog surpreendente...

Lana disse...

Olá
é a primeira vez que aqui venho, vim ela mão da Sininho do blog ecos da falésia.
conheço bem o campo, pois apesar de ser da cidade, toda a minha vida fui ao campo e vivo no campo nas férias e fins de semana que me é possivel e, inclusivé auxilio nas tarefas agricolas quando é necessário.
o teu blog fez-me sentir o cheiro fresco da manhã, os tentilhões que cantam no meu telhado da aldeia e o som da água na ribeira que passa no fundo da minha casa...
os rostos são coisas maravilhosas, mapas de vidas trabalhosas mas assertivas e plenas...
voltarei e muitos parabéns por tudo o que vi e que queres sem nada em troca partilhar com o mundo.
1 sorriso mto luminoso
Lana

Eduardo Santos disse...

Caro amigo. Algumas vêzes passei por este espaço, embora creia que não tenha comentado qualquer artigo. Mas hoje ao revêr o blog, "O moinho e a vida" prendeu-me a atenção. Não queria deixar passar a oportunidade e com toda a sinceridade felicitar o seu trabalho, quer quanto ao texto, quer quanto à qualidade fotográfica das imagens que o acompanham. São relatos de vida para recordar. Saudações amigas.

sonia a. mascaro disse...

Que belas fotos e ótima reportagem!

Rui Valente disse...

Só para matar saudades. Fazia tempo que não dava balho aos olhos e precisava de os lavar da poluição política de que o Porto continua a padecer.
A Cidade Surpreendente é um autêntico bálsamo para a nossa auto-estima.
Obrigado, Romão