02 agosto 2006

O Palácio do Comércio





Em muitos de nós, a palavra palácio desperta de imediato o conceito de casa real ou nobre, oriundo, talvez, dos tempos em que o imaginário infantil era povoado pela leitura de contos de príncipes e princesas, com fadas à mistura.
O termo, no entanto, tem também, como se sabe, o significado mais concreto de casa grande, aplicado a muitos edifícios que compõem a cidade.
O prédio da Rua de Sá da Bandeira que as imagens representam, e que o afã diário nos impede de observar, foi provavelmente construído no início dos anos cinquenta. É majestoso e equilibrado, contudo, dele não encontrei qualquer referência na bibliografia que consultei sobre arquitectura do século XX no Porto. Quem terá projectado o Palácio do Comércio?

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7 Agosto 2006

Quando deixei no ar a pergunta sobre a autoria do projecto de arquitectura do Palácio do Comércio não estava à espera que o resultado fosse tão proveitoso. A questão vale o que vale, isto é, só interessa aos curiosos destas causas. O resultado, produto da contribuição de Pedro Lessa, Tiago Azevedo Fernandes - criador e moderador do único fórum virtual de cidadania em Portugal - se outro houver, façam o favor de me dizer que eu corrijo - e Álvaro Mendonça, permite elaborar uma pequena ficha do notável edifício que ocupa todo um quarteirão no alto da Rua de Sá da Bandeira.

O projecto de arquitectura é de David Moreira da Silva, genro de Marques da Silva o arquitecto que, a par de Nicolau Nasoni - em tempos diferentes -, mais marcou o Porto com a sua arte.
O apelido Moreira da Silva levanta-me outra questão. Terá alguma ligação familiar com o horto de Moreira da Silva, que na rua de Rua de D. Manuel II, diante do Museu de Soares dos Reis, foi substituído por um mastodonte de betão e vidro? Aí o horto ostentou numa empena, durante muitos anos, o belo e imperativo lema, inscrito na silhueta escura duma pêra, «Plantai as Nossas Árvores e Colhereis os Melhores Frutos». Plantai. Colhereis. O abuso da corruptela fez, entretanto, desaparecer da linguagem corrente a conjugação da segunda pessoa do plural... Continuemos.

Segundo Álvaro Mendonça, o promotor do Palácio do Comércio foi «Delfim Ferreira, conde de Riba d'Ave, tendo-se encarregado da sua construção, a Cooperativa dos Pedreiros sob projecto de engenharia de Teixeira Rego». «(...) o custo total da obra, considerado gigantesco para a época, terá rondado os 300 mil contos. Toda a caixilharia é em bronze e alguns dos vidros aplicados em algumas das janelas e vitrinas, são em formato curvo e, ao que apurei, foram importados da Bélgica, a preços elevadíssimos», acrescenta Álvaro Mendonça no seu comentário. Informações preciosas, a que acrescento a de Pedro Lessa que nos diz que a data do projecto é 1941, de acordo com o Jornal dos Arquitectos, nº 85 de Março de 1990, pág. 31.
O meu obrigado a todos.

26 comentários:

Francisco del Mundo disse...

Magnífico...Magnânimo...

CARMO disse...

É sim senhor. A localização é que nos impede de o observar com mais requinte... de maneira que só os mais atentos é que o "vêm"!!!

azuki disse...

assim de repente, nem consegui reconhecê-lo...

Anónimo disse...

de facto não encontro nada sobre o autor mas uma boa solução era procura no edifício, exteriormente ou interiormente às vezes existem marcos, sejam placas da câmara ou assinaturas gravadas, outra solução que me apercebi ser útil quando tinha de descobrir autores de casas no meu primeiro ano é simplesmente bater à porta e perguntar a quem já la está há mais tempo..

th disse...

Meu caro amigo, não identifico nem edifício nem rua através desta foto. Entretanto deve haver história que chegue ligada possivelmente, quem sabe, ao vinho do Porto.
Eu não desistiria de procurar.
Abraço, th

Anónimo disse...

Tantas vezes passei nestas ruas, Sá da Bandeira e «agora não me lembro», será Fernandes Tomás?) e nunca reparei como o edifício é imponente e bonito. Nos anos 50, a sede da empresa onde o meu pai trabalhava, a Hidouro, era aqui, com entrada pela rua de trás, paralela à Sá da Bandeira (do nome desta então é que não me lembro mesmo).
A Cidade Surpreendente foi-me indicada por amigos e periodicamente visito-a. As suas fotografias são sempre lindíssimas e os textos muito beons. Admiro também A Outra Face da Cidade Surpreendente. Tenho pelo Porto sentimentos contraditórios. Ao fim de vários anos sem visitar a cidade, fiquei em estado de choque quando desembarquei em São Bento e me apercebi do estado de ruína a que tinha chegado. Os belos prédios das ruas nobres da minha infância totalmente, ou quase, abandonados e degradados (31 de Janeiro, um horror!, Mouzinho da Silveira,Santa Catarina e outras. Pior que Lisboa! Chorei!). Por exemplo, lembro-me muito bem da Albergaria e do snack-bar da Brasileira,com entrada pela rua do Bonjardim. Como é possível que esteja tudo abandonado?
Conheço vários jovens lisboetas, incluindo os meus filhos, que sentem um grande fascínio pelo Porto e que de vez em quando decidem passar dois ou três dias na cidade, a pretexto de assistirem a um concerto ou apenas para passearem. Também por eles tenho sabido as últimas novidades da ponte D. Luís renovada, do metro, da Casa da Música, dos bares da Foz, do vazio da Avenida dos Aliados, etc. No entanto, nunca deixam de frisar o estado de abandono da cidade. A ponto de dizerem, com sentido de humor, eles que tanto gostam do Porto, mal regressam a Lisboa, «Agora já estamos em terreno seguro».
Adeus! Saudações da cidade branca.
Zana

Anónimo disse...

Caro Carlos Romão, em resposta à sua interrogação acerca da autoria do projecto de arquitectura, aqui vai a resposta. O autor é o arq. David Moreira da Silva. Parabéns pelo blog do qual sou assíduo frequentador. Cumprimentos.

9-9 disse...

Excelente foto! Nunca tinha reparado que este Palácio ocupava este espaço todo e passo muitas vezes por aqui. Ainda bem que há quem tenha tempo e olhar atento para fazer um blog assim!

blue kite disse...

a verdade é que nunca reparei muito no edifício. Tive de visualizar a praça na minha cabeça paar ver do que me lembrava e depois olhar outra vez para a foto.

Talvez este seja um daqueles casos em que a foto é melhor que a realidade :)

Tânia Magalhães disse...

Ao ver a foto iniciei logo o pensamento do que poderia escrever. Depois de ler todos os comentários cheguei à conclusão que somos muitos os que olhamos sem ver! Inicialmente também não reconheci o edifício, também o achei muito bonito. Fiz um esforço e reconheci a rua, mas confesso que nunca o tinha olhado nesta perspectiva. Só o olhei até então ao nível dos olhos e nunca reparei que era tão alto e imponente.
Parabéns pelo blog interessante.

TAF disse...

Em complemento ao comentário do Pedro Lessa, fica a informação de que o Arq. David Moreira da Silva foi colaborador e também genro do Arq. Marques da Silva.
http://sigarra.up.pt/up/web_base.gera_pagina?p_pagina=2446

Carlos Romão disse...

Mariana,
Não existe qualquer inscrição com o nome do autor no edifício. Quanto às portas são inúmeras e, aparentemente, o prédio está ocupado com escritórios.

Th,
Lembras-te da capela de Fradelos? Fica nessa rua.

Zana,
Lamentavelmente o abandono da baixa do Porto é comum a outras cidades europeias. Um caso gritante é o de Cartagena, na província autónoma de Múrcia, em Espanha. Por razões diferentes das do Porto, a degradação deste município, com cerca de 200 000 habitantes e um centro histórico pequeno mas muito interessante, chega a ser comovente.
Quanto ao Palácio do Comércio, é um imenso bloco que ocupa todo o quarteirão limitado por Sá da Bandeira e Fernandes Tomás - na fotografia ? e ainda pela ruas da Firmeza e do Bolhão. O ãngulo da foto, correspondendo ao rosto do edifício, é o mais interessante devido ao torreão; nas outras ruas revela-se, quanto a mim, demasiado austero.
Saudações? à cidade branca.

Caro Pedro Lessa,
muito obrigado pela informação. Terá mais alguma dica sobre o Palácio do Comércio? A razão do nome, o ano da construção e o que motivou o promotor?

Blue Kite,
a foto só retrata a realidade, não é melhor nem pior ;)
A diferença é que aqui a realidade está comprimida num pequeno espaço, sendo assim mais fácil de observar.

João,
só um comentário a propósito da paternidade da blogosfera. O primeiro blogue em português de Portugal foi o Ponto Media, criado em 2001 pelo jornalista António Granado. O Abrupto, sendo um blogue incontornável, nasceu dois anos e meio depois, em Maio de 2003.

Caro TAF,
a coisa começa compor-se :)

Anónimo disse...

Relativamente ao que me questiona Carlos, infelizmente a informação disponível sobre a arquitectura portuguesa é quase nula ou inexistente. nem neste recente livro, o inquérito à arq.portuguesa do séc XX, o qual considero bastante incompleto e infeliz. a informação a que tive acesso apenas diz o autor e a data do projecto (1941).consta no Jornal dos Arquitectos, nº 85 de Março de 1990, pág. 31. contudo, para uma pesquisa mais aprofundada, talvez uma visita à casa do arq. Marques da Silva, como sugere o estimado TAF (aliás, realizamos lá uma interessante visita em conjunto), uma vez que nessa visita, sendo genro do mestre Marques da Silva, o seu nome foi várias vezes referido. existindo informação, com toda a certeza que será em formato tradicional, ou seja em papel e desenhos.
sempre a considerá-lo, cumprimentos.

rps disse...

Por acaso, esse bel edifício não me passa despercebido: trabalho há 19 anos em Sá da Bandeira... E foi no Palácio do Comércio que abri a minha primeira conta-ordenado. No vetusto BPSM, agora feito Millenium.

Anónimo disse...

Como portuense de gema (nasci e cresci na freguesia da Vitória), fiquei agradavelmente surpreendido com ?A Cidade Surpreendente?, depois da minha primeira e recente visita ao blogue.
Porque gosto muito da minha cidade e porque a vejo tão bem retratada, quer nos textos, quer através do soberbo trabalho de imagem, sinto-me obrigado a enviar os meus parabéns. Prometo voltar sempre e já agora aproveito para enviar algumas notas sobre a dúvida de Carlos Romão:

O Palácio do Comércio foi projectado pelo arquitecto David Moreira da Silva, genro do grande mestre da arquitectura portuense, José Marques da Silva.

Edificado em granito, foi mandado erigir por Delfim Ferreira, conde de Riba d?Ave, tendo-se encarregado da sua construção, a Cooperativa dos Pedreiros sob projecto de engenharia de Teixeira Rego.

Não tendo informação segura quanto ao ano da conclusão da obra, creio no entanto que terá andado pelos finais da década de 40 ou início de 50, do século passado.

Sei também, por informação de fonte crível, que o custo total da obra, considerado gigantesco para a época, terá rondado os 300 mil contos. Toda a caixilharia é em bronze e alguns dos vidros aplicados em algumas das janelas e vitrinas, são em formato curvo e, ao que apurei, foram importados da Bélgica, a preços elevadíssimos.

delusions disse...

O blog é fantástico! Parabéns pelo optimo trabalho desenvolvido tendo como tema esta linda cidade.Uma cidade surpreendente, de facto.

Anónimo disse...

O mundo é mesmo pequenino...

O meu pai trabalha nesse belo edifício há cerca de 25 anos. Sempre me foi familiar(até porque morei até aos meus 15 anos na Rua de Fernandes Tomás, com vista para lá, e todos os dias a caminho da escola primária eu lá passava em frente), mas só de há poucos anos para cá é que me deu alguma cuirosidade para saber que talento o assinara. Fiquei hoje, aqui, a saber essa informação. O meu bem hajam.
E fiquei também a saber quem o mandou construir... que é nem mais nem menos o mesmo homem que desenvolveu a terra onde o meu pai nasceu - Riba D'Ave. Coincidências.

O meu obrigada ao Carlos por se ter lembrado deste quarteirão da Baixa, que está tão presente na minha infância.

Pé de Salsa disse...

É interessante como consegue que até os mais jovens se interessem pela história e pela arquitectura dessa bela cidade.

Belas imagens, bem reais, que merecem o destaque aqui presente.

PARABÉNS!

Mónica (em Campanhã) disse...

Carlos, creio que nos andares superiores há habitações - dignas de um palácio -, contou-me o meu pai que em tempos foi perito de seguros e fez lá umas avaliações.

Ana disse...

o que e que se passa?

Sol disse...

Nem de propósito. Ainda ontem passei por este edifício e disse para os meus botões: Passo imensas vezes por aqui e nunca tinha reparado nos cavalos no topo do edifício...
Agora que visito o teu blog, encontro uma foto do dito...
Ainda dizem que não há coincidências!

Fernando Rola disse...

Carlos, o edifício é grandioso, sem dúvida e até é um daqueles que cuja arquitectura me agrada particularmente no Porto. Mas permita-me que realce uma frase que escreveu: "o abuso da corruptela fez, entretanto, desaparecer da linguagem corrente a conjugação da segunda pessoa do plural". É tão verdade que, de repente, parece que a frase "o mundo pula e avança" deixou de ter sentido...

Anónimo disse...

Relativamente a este palácio do comércio devemos realçar a importância do seu promotor:
Delfim Ferreira (industrial textil), nasceu em Riba de Ave a 13 de Dezembro de 1888 e faleceu a 24 de Setembro de 1960.
Quando, "em 1960, Delfim Ferreira morreu, era provavelmente a maior fortuna pessoal portuguesa"(Fortunas & Negócios:revista).
Eduardo Santos Carneiro
V.N.Famalicão

Anónimo disse...

Pois, meu caro Carlos Romão, só hoje tive o gosto de tropeçar neste seu post.

A si e a todos os interessados venho informar que, por incumbência dos proprietários do Palácio do Comércio, a Luxíade Lda, de que sou gerente, está a editar um livro com toda a história daquele edifício.

Poderei ser contactado para «augusto.canedo@luxiade.pt».
Abraço. Augusto Canedo

Anónimo disse...

O palácio do comércio no porto é um edifício magnífico. Já nos meus tempos da adolescência reparei imensas vezes naquele soberbo "palácio". O Porto todavia possui inumeros edifícios de semelhante imponência. É pena que muitos deles estejam ao abandono ou esquecidos da maioria dos cidadãos. Ou pior, que os cidadãos do Porto não dêem o seu devido valor ao que possuem. Porém, bem pior do que tudo isso é que o Porto perdeu o seu orgulho como cidade das finanças, do comércio, da indústria. Nas últimas décadas apenas se construiram "mamarrachos" horríveis. Ah como interessantes devem ter sido as primeiras décadas do século XX. E também as últimas do século XIX a avaliar pela avenida dos aliados, entre outras artérias. Os últimos autarcas deviam olhar para os exemplos e para as obras grandiosas do passado. Os actuais autarcas deixaram o Porto cair no provincianismo. Alguém tem informações acerca daquele extraordinário prédio entre as ruas do Cândido dos Reis e a do Conde de Vizela e que ocupa um quarteirão completo? Apesar do seu estado lastimavel de conservação é um edifício maravilhoso e que se podia facilmente imaginar num dos bairros cosmopolitas de Manhattan (mas em ponto mais pequeno).
Ricardo

Unknown disse...

Passei horas a olhar para este belíssimo edifico em criança, enquanto esperava o autocarro! Admirava também a sua escultura com os cavalos!